quinta-feira, 18 de outubro de 2018

Darwin às avessas nas redes sociais: teoria da involução da espécie

Sou um privilegiado no aspecto de que durante toda a vida estive próximo e induzido à reflexão e à crítica - nem sempre nessa ordem, mas preferencialmente. É parte desse processo analisar fenômenos sociais e suas consequências, seja como leigo ou a partir da ótica um pouco mais elaborada da profissão que exerço. Estou certo de que existe uma unanimidade comum aos fenômenos sociais: eles nunca são unanimidades. Há quem apoie e há quem condene a ditadura militar ou os governos defensores da privatização dos anos 1990 ou os governos deste século que se posicionam como mais populares, a mudança de paradigma nas artes e na música, o Acordo Ortográfico e a invasão de termos estrangeiros na língua do dia a dia, o futebol de resultados e não mais de espetáculo, o Big Brother e o Big Bang. Claro que também tenho minha opinião sobre eles, inclusive a opinião de que não preciso ter opinião sobre tudo - ou porque não vai fazer diferença, ou porque o assunto não me interessa mesmo, e seguimos com a vida.
Porém, tem me incomodado de uns tempos pra cá, pela dimensão que tomou, essa coisa da polarização/discurso de ódio que, iniciada há uns anos com o escudo que a internet oferece às pessoas para se manifestarem sem piedade nem respeito ou reverência, está saindo das redes sociais e vindo à vida real. Penso nisso e fico um tanto preocupado, estarrecido, quase depressivo. Pra ilustrar com fatos recentes (estou falando em outubro de 2018), o show de Roger Waters em São Paulo e a discussão em torno do segundo turno das eleições presidenciais demonstram pra mim que o foco, em muitos campos, começa a deixar de ser o evento ou fato ou fenômeno em si, e passa a ser o "inimigo que pensa diferente e precisa ser destruído". E falar dessa forma já não é figura de linguagem, não é metáfora que poderia ser substituída por "um outro ser humano que eu quero tentar convencer" ou coisa que o valha. A música de Mr. Waters, sabidamente um crítico de certos setores da sociedade desde a época do disco THE WALL, do Pink Floyd (1980), perde o protagonismo do evento porque a posição dele em relação ao momento eleitoreiro do Brasil é mencionada no telão, e a coisa se torna uma disputa de # ELESIM versus # ELENÃO. Felizmente, esse episódio não trouxe maiores consequências. Mas as mortes da vereadora carioca no primeiro semestre e do capoeirista na Bahia são exemplos fortes de que a coisa está de modo alarmante deixando de ser apenas retórica.
A internet ajuda bastante quem tem vocação pra humildade. Mas para a maioria, o efeito dela parece estar sendo este: diplomadora em massa de fanáticos, de donos de pseudoverdades rasas, de odiadores de qualquer coisa que, agora, estão perdendo o medo de levar seu pensamento a perigosas vias de fato. A imbecilidade formalizada.
Darwin, se estivesse por aqui, provavelmente iria rever para onde aponta o vetor de seus famosos conceitos.

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